Flora Figueiredo
Porque a vida é feita de proibições,
Eu não compus todas as canções,
Não percebi a brisa suspirar,
Eu esqueci cantigas de ninar,
Dei chances demais à voz dos credos
Não rompi de vez todos os medos,
Roubei do tempo um tanto de carinho,
Não vi a flor amar o passarinho,
Perdi o trem na curva da vertente
E não deixei o mel melar completamente.
Porque a vida é cheia de proibições,
Larguei o fio, soltaram-se os balões,
deixei que o peão revirasse sozinho,
mandei que o zangão se zangasse baixinho,
desprezei a bruma que baixou o véu,
permiti à palavra dormir no papel,
evitei o desvio que atravessa a estrada,
não quis o desafio da ronda embriagada,
não li o poema do poeta maldito,
e não tive o dilema do beijo infinito.
Porque ainda há tempo para o encantamento,
quebre-se o vidro do sermão absoluto,
rompa-se a teia, reveja o estatuto,
que a primavera quer amar o chão de vento.